O Photoshop surgiu comercialmente como um software de retoque para fotografias digitalizadas em scanner. O próprio scanner digital era uma curiosidade rara em 1990. Mas as funções de retoque de imagem do primeiro e humilde Photoshop já eram poderosas e fascinantes - um vislumbre de infinito potencial artístico.
O talento do programa consolidou-se com a adição de recursos de design, composição e automação. Uma vantagem importante desde o início foi a possibilidade de acrescentar funções novas através de plug-ins; foi daí, aliás, que surgiu a ideia de extensões que temos hoje em navegadores da web.
Os primeiros filtros e funções de edição do Photoshop continuam disponíveis na versão mais atual, mas raramente encontram aplicação, pois foram suplantados por outros mais modernos e eficazes. A acumulação de funções ao longo de duas décadas explica porque partes do programa são arcaicas e obscuras enquanto outras parecem transplantadas de algum outro lugar.
A história do software
O Adobe Photoshop começou como projeto diletante de um par de irmãos norte-americanos, fãs de fotografia por influência paterna. John Knoll era então, e ainda é hoje, um supervisor de efeitos visuais para cinema da Industrial Light & Magic, a empresa pioneira fundada por George Lucas. Em 1987, ele estava investigando a possibilidade de usar sistemas computadorizados para gerar e manipular imagens de efeitos visuais para filmes. Além da computação gráfica em 3D, ele esperava também poder fazer retoques localizados e alterações tonais - um campo então pouco explorado da manipulação visual. Fotografia e design nem passavam por sua cabeça, inicialmente.
Thomas Knoll cursava Engenharia na Universidade de Michigan. Estava criando num Mac Plus um software de processamento de imagem para sua tese de doutorado. O nome do programinha era Display, porque sua função original era simular tons de cinza na tela do Mac, que só suportava pixels totalmente brancos ou pretos. John viu um potencial comercial no Display e incentivou o irmão a colocar mais funções no programa. Thomas trancou a faculdade e mergulhou no projeto junto com o irmão.
A primeira versão preliminar do aplicativo com uma aparência mais acabada, chamada ImagePro, rodou em setembro de 1988. Nessa altura, o software já era mais avançado que tudo que existia então no mercado. John foi procurar alguma empresa de software do Vale do Silício para fazer a comercialização.
O programa, renomeado para PhotoShop (inicialmente com S maiúsculo), foi distribuído por um fabricante de scanners chamado Barneyscan. Logo depois, porém, os irmãos fecharam um acordo com a Adobe, empresa que fizera fama e fortuna com o sistema PostScript de impressão computadorizada. A Adobe acolheu o produto, sem adquiri-lo completamente, pagando royalties aos irmãos. O Photoshop da Adobe foi oficialmente lançado, após dez meses de desenvolvimento adicional, em 10 de fevereiro de 1990, somente para Apple Macintosh.
A Adobe plantou o Photoshop no mercado sem pretensões exageradas, com uma confiança tranquila de que ele poderia dar frutos mais adiante. E efetivamente, o Photoshop estabeleceu-se como líder absoluto em seu segmento, obliterando muitos concorrentes que surgiram e cujos nomes hoje estão esquecidos. Alguns deles, como Altamira Composer e Macromedia XRes, chegaram a ser mais avançados que o Photoshop em sua época, mas não resistiram à concorrência.
O sucesso da Apple e da Adobe entre profissionais de imagem digital, bem como as infinitas ramificações desse sucesso em toda a indústria criativa do mundo, deve muito ao desenvolvimento inicial do Photoshop no Mac. Mas na versão 2.0 o Photoshop também foi lançado para Windows. A partir daí, as edições do programa sempre tiveram paridade de funções.
Laboratório fotográfico
Quando o Photoshop surgiu, a edição digital de imagem avançada era um negócio extremamente caro e restrita a sistemas dedicados. O que existia de mais avançado em seu tempo era o Scitex, equipamento de prepress (preparação para impressão) desenvolvido em Israel. Um scanner de mesa custava entre US$ 5 mil e US$ 12 mil (equivalente a R$ 9,2 mil e R$ 22 mil) em 1989. O BarneyScan, digitalizador de slides que trouxe com ele a primeira versão pública do Photoshop como brinde, custava US$ 5 mil. Impressoras coloridas por transferência térmica (a mesma presente em modelos atuais da linha Xerox Phaser) saíam por até US$ 20 mil dólares. Um Mac da linha profissional, dotado dos periféricos necessários (monitor de alta resolução, unidade externa de disco e expansão de memória) custava a partir de US$ 10 mil. Tudo isso apenas para fazer diagramações preliminares que depois seriam reconstruídas ou completadas no computador de prepress, já que as máquinas de mesa ainda não davam conta de toda a tarefa.
Bastaram cinco anos para um computador de mesa conseguir produzir saída final para a gráfica e o Photoshop, então um aplicativo ainda simples e entregue na forma de três disquetes, virar o jogo e dar ao povo o poder de criar arte digital. A partir da versão 2.0, o Photoshop passou a integrar o departamento de arte das redações mais progressistas. Nada mais de deixar o processamento das imagens por conta do bureau de prepress.
A versão 3.0, com a sua concepção de arte por camadas, alterou para sempre a cara da arte digital e consagrou o Photoshop como ferramenta de composição. Sua chegada coincidiu com uma nova geração de PCs e Macs muito mais poderosos e por fim capazes de lidar com arquivos bem mais pesados. Foi também nessa época que o mercado de plug-ins de filtros criativos teve seu auge.
A revolução seguinte foi da da web; a versão 5.5 e o programa auxiliar ImageReady vieram especificamente para otimizar a exportação de imagens GIF, PNG e JPG. Por fim, na versão 7, ele sacudiu o mundo da fotografia com o suporte a arquivos RAW de câmeras digitais. Desde então, o desenvolvimento do Photoshop teve como preocupação básica integrá-lo aos demais programas da chamada Creative Suite da Adobe, mantendo-o numa posição de liderança indisputada.
Hoje e além John Knoll continua na ILM. O irmão Thomas permanece envolvido com o Photoshop. Sua última invenção foi o plug-in Camera RAW. O Photoshop também gerou duas crias importantes sob a tutela de Knoll: Elements, a versão não-profissional, porém repleta de utilidades; e Lightroom, uma recriação completa do programa que atende aos fotógrafos.
A ideia do Camera RAW, um programa capaz de extrair imagens puras (não processadas) de muitos modelos de câmeras digitais, surgiu durante uma viagem de férias de Thomas com sua família à Itália. Em vez de descansar, ele passou a viagem inteira tirando fotos de teste numa câmera profissional e refinando nelas os algoritmos matemáticos necessário. O objeto de teste usado nas fotos não era uma ruína romana ou a costa mediterrânea, mas a orelha esquerda da filha dele. Segundo Knoll, ela estava por perto a qualquer momento que ele precisasse e a orelha era uma boa referência para tonalidades de pele humana; então, por que não?
Retoques em fotografias existem desde que a própria fotografia foi inventada e sempre foram vistos como continuação do trabalho de laboratório. O Photoshop surgiu com ferramentas virtuais que buscavam reproduzir o ambiente do laboratório, e isso ainda pode ser visto claramente nos ícones de Crop, Dodge e Burn, por exemplo. Mas a metáfora do mundo real nunca foi dominante; o software possui uma interface bastante abstrata, que exige esforço interpretativo do usuário novato. O que não impediu que ele atingisse uma popularidade gigantesca, justificada pelos seus poderes extraordinários.
O Photoshop caiu na boca do povo porque, a exemplo de outros programas como Microsoft Windows e CorelDRAW, é um dos softwares mais pirateados por usuários individuais. Apesar das implicações polêmicas, é inegável que a difusão ilegal do programa ajuda a mantê-lo forte na consciência das pessoas. Os programas de visualização de imagem que vêm nos computadores permitem uma edição elementar, e também existem soluções gratuitas baseadas na Internet, sem necessidade de instalar nada. Mas o poder ilimitado do Photoshop prova-se, geração após geração de usuários, irresistível.
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