A revista "Science" divulgou na quinta-feira (21), depois de meses de expectativa, os detalhes de uma pesquisa que tornou o vírus da gripe aviária transmissível entre mamíferos.
O artigo traz os resultados de um dos grupos de pesquisadores "censurados" no ano passado pelo governo americano. O país pediu que os estudos ficassem em segredo por temer que fossem usados no bioterrorismo. Um dos trabalhos já saiu na "Nature".
No estudo divulgado agora, cientistas dos EUA, do Reino Unido e da Holanda mostram como modificaram geneticamente o vírus H5N1, que causa a gripe aviária, até torná-lo transmissível por via área em ferrets --mamíferos que têm sintomas da gripe semelhante a dos humanos.
Na sua "forma original", esse vírus só é transmitido entre aves ou, raramente, de aves para seres humanos.
Os cientistas, coordenados por Ron Fouchier, do Centro Médico Erasmus, da Holanda, fizeram três mutações específicas no vírus e infectaram os ferrets em laboratório.
O vírus modificado ainda sofreu mais duas mutações -- o que é comum, pois vírus são bastante instáveis, diferentemente de bactérias. Foi esse "novo" vírus que conseguiu migrar por via aérea dos ferrets contaminados para os sadios.
O problema é que essas informações são um prato cheio para o bioterrorismo. A preocupação com uma possível guerra biológica levou à censura dos dados sobre a mutação em dezembro de 2011.
As pesquisas foram interrompidas e o debate chegou à OMS (Organização Mundial da Saúde), que pediu que a caixa-preta fosse aberta.
"Fazer mutações em vírus em laboratório para fins acadêmicos é completamente aceitável. Não podemos parar essas pesquisas por temor de bioterrosimo", afirma o engenheiro agrônomo e especialista em bioética Mohamed Habib, da Unicamp.
"Agora, pesquisadores de todo o mundo poderão trabalhar com os dados da gripe aviária e aprimorar o conhecimento sobre o vírus, o que pode resultar em melhores medicamentos", comemorou Bruce Alberts no editorial desta edição da "Science".
RISCO DE PANDEMIA
De acordo com outro trabalho da "Science" sobre o mesmo assunto, de Derek Smith e colegas da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, é impossível estimar com precisão a possibilidade de as mutações feitas em laboratório acontecerem naturalmente no ambiente.
Mas o estudo sugere que todas as mutações necessárias para contaminar um mamífero poderiam acontecer em um único hospedeiro na natureza. Isso, sim, sinaliza um risco de pandemia.
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